As
condições de hoje não são as mesmas do passado recente, mas os resultados da
atual crise poderão ser idênticos. A oferta e o consumo de energia cresceram,
como também cresceu a malha de transmissão. Mas nada cresceu como a ganância
das distribuidoras privatizadas que – lastreadas em contratos draconianos de
concessão (também chamados de privatização)– impõem ao consumidor uma das mais
caras tarifas de energia elétrica do mundo, enquanto a qualidade dos serviços
prestados é sofrível. E piora com o passar do tempo.
Para
o não especialista, ávido por compreender o que se passa para ter a sua
opinião, reina uma grande confusão. Pois uma grande parte dos chamados
“especialistas”, convidados a opinar e debater, e dos chamados
“articulistas”,ou “formadores de opinião”, acaba cometendo uma fraude contra os
cidadãos. Querem fazer crer que o que dizem são comentários objetivos, isentos,
sem ideologia. Quando estão, na verdade, comprometidos com os interesses das
empresas, do capital, do mercado.
Não
assumir a visão ideológica é cinismo, empulhação. Dizem acreditar de fato que a
mão invisível do mercado pode tudo, que o liberalismo é o que pode resolver os
problemas existentes. Problemas esses resultantes essencialmente da
mercantilização da energia elétrica, promovida pelos guardiões do pensamento do
mercado a partir de 1995, e que culminou no racionamento de 2001/2002. Em 2004,
depois de sofrer pequenas mudanças cosméticas, o Modelo do Setor Elétrico
passou a ser chamado de “Novo Modelo do Setor Elétrico”.
Dizem
que a situação vai de mal a pior por obra e culpa do governo de plantão. Falam
em nome de uma ideologia à qual devotam uma crença inabalável, e prestam um
desserviço aos interessados em informações, quando emitem opiniões baseados em
um só lado da moeda. Partidarizam a discussão, fazem a luta política em um
contexto no qual a política elétrica atual é uma continuação daquela de
governos e partidos políticos que governaram o país desde o começo da Nova
República. É o sujo falando do mal lavado.
O
que esses “especialistas” não questionam é a existência de uma concentração de
poderes e de um acentuado caráter autoritário na condução da política do
setor elétricono país, o que acaba subordinando o futuro ao presente. Verifica-se
que, ao longo do tempo, feudos partidários foram instalados no governo federal,
sendo um deles o Ministério de Minas e Energia, cujo segundo escalão concentra
muitos órgãos com alto e forte poder de decisão financeira e administrativa. É
uma excrescência este ministério, tão relevante e estratégico ao país, ser
considerado como moeda de troca no “toma lá, dá cá” das composições políticas.
E o loteamento político do atual Ministério de Minas e Energia repete fórmulas
já usadas nos governos anteriores.
Preconiza-se,
com urgência, uma maior publicização da questão energética na sociedade,
incentivando o debate de ideias e o confronto de interesses em condições
adequadas de informação e conhecimento, se constituindo assim em instrumentos
fundamentais na formulação de uma estratégia energética sustentável e
democrática. A democratização do planejamento do setor energético por meio da
abertura de espaços efetivos e transparentes de participação e controle social
é tarefa para ontem.
Dentre
as medidas recentes tomadas para combater a crise elétrica, uma que se
convencionou chamar de “realismo tarifário” promoveu um aumento desproporcional
e despropositado das tarifas elétricas, beneficiando diretamente o caixa das
distribuidoras, que exercem um forte lobby junto às autoridades do setor
elétrico. Sem dúvida, energia mais cara acarretará menor consumo, que assim
aliviará, em parte, a pressão sobre a demanda, i.e. sobre o sistema como um
todo.
Entre
essas e tantas, debater a regulação econômica da mídia é mais do que necessário
é urgente. Somente assim poderemos almejar uma sociedade com mais pluralismo e
mais democracia, com cidadãos que poderão olhar criticamente uma notícia sob
variados pontos de vista e não apenas a partir da “verdade única” dos colunistas,
dos “especialistas”, desses endeusadores do oráculo do mercado. (Heitor
Scalambrini Costa, UFPE)
Nenhum comentário:
Postar um comentário